terça-feira, 9 de julho de 2013

Sobre a morte do MC Daleste. (Adriano Goulart)


Sobre a morte do MC Daleste. (Adriano Goulart)

"Tá lá mais um corpo estendido no chão...." MC o que mesmo? Morreu tomando um tiro enquanto fazia um show de funk. Agora virou notícia. Ficou famoso. 
Tem gente fazendo poesia, dizendo o tanto que o menino era legal. Legal?
Um pobre coitado, como tantos outros que fazem sucesso instantâneo no youtube com sons medíocres, e na outra semana voltam a lavar carros , porque jamais terão oportunidades efetivas de serem o que acham que é bom. Essa é a tragédia. Do dia-a-dia. 

Nós? Uma sociedade hipócrita que valoriza a gozação, a prostituição avulsa e sem sentido das meninas nas letras de funk, a chamada "ostentação" num estilo músical, de gente que nem se quer tem água tratada em casa para beber. "Oi nóis convida porque sabe que elas vem." Essa é a tragédia. 

O menino morreu. Com todo respeito a ele e a sua família e tantos outros, já estavam mortos. Mortos de vida, e vida em abundância. De vida que vale a pena. E não a lástima de futuro com que sonhava ou sonham esses meninos. Uma riqueza vazia e pronta para correr por entre suas mãos. Porque eles nem sabem o que é isso. Vida. Não tiveram e nem tem chances nem sequer de ter isso dignamente.  Essa é a tragégia. 

Pobreza e miséria sempre fizeram parte de suas histórias. Quantos deles terminam o ensino fundamental? Quantos deles tem oportunidade de ir ao médico, a um oftalmologista, a um dentista  ao menos 1 vez ao ano? Quantos deles tem comida na mesa diariamente? Se sobreviverem aos tiros dos traficantes e da polícia na idade que tem, poucos chegarão aos 60, pois não tiveram educação, saúde , segurança e por aí vai. Essa é a tragédia. 

A gente valoriza a morte. A violência. Isso fica claro quando o que sai na mídia é o "tiro e sangue do menino" e não as mazelas que estão ao seu redor. 

A gente valoriza o sexo e prostituição. Quando acha engraçado meninas que não sabem nem falar, e não tiveram mães ou pais que disseram que o ato de mostrar a bunda para aparecer é feio, ao contrário do que elas pensam, ser bonito. 

A gente valoriza a burrice, quando compartilha imagens e textos completamente idiotas e medíocres, só porque tem um sonzinho bacana. Essa é tragédia. 

Tem alguém preocupado ou chocado com a morte desse menino de verdade? Essa é a tragédia. Quem compartilha isso está preocupado em verdade é com sua própria vaidade. Com a chance de atrair para si atenção de seus perfis e textos, através da mesma receita: morte, violência, sexo, dinheiro e burrice. Muita burrice. Essa é tragédia. Amanhã outro morre e quem era mesmo o menino que morreu semana passada?

Diria Renato Russo, "vamos celebrar o horror de tudo isso, com festa, velório e caixão. Está tudo morto e enterrado agora , já que também, podemos celebrar, a estupidez de quem cantou essa canção." 

Morreu.

Adriano Goulart 

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